PEC da Escala 6×1, Caminho para Melhorar as Condições de Trabalho ou Desafio Econômico para as Empresas?
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) gerou grande repercussão e mobilizou diversos setores da sociedade. A proposta, que busca acabar com a escala de trabalho 6×1 — em que os trabalhadores trabalham seis dias consecutivos para um descanso — e reduzir a carga semanal de 44 para 36 horas, representa uma mudança significativa no modelo de trabalho adotado no Brasil, principalmente em setores que têm demandas intensas, como o comércio, os serviços de atendimento ao cliente e as áreas de alimentação e varejo.
A PEC, ao mesmo tempo que levanta a bandeira pela qualidade de vida e bem-estar dos trabalhadores, também traz à tona questões complexas e desafios que precisam ser considerados. Como cientista político, tenho estudado as várias implicações dessa proposta, e acredito que é fundamental entendermos o que realmente está em jogo para todas as partes envolvidas.
O que é a Escala 6×1 e o que propõe a PEC?
Hoje, a escala 6×1 é amplamente utilizada em setores como o comércio e o atendimento ao público. A prática permite que o trabalhador trabalhe seis dias consecutivos, com direito a apenas um dia de descanso, algo que, com o passar do tempo, pode ter efeitos negativos no bem-estar, na saúde física e mental e na qualidade de vida das pessoas . Com a PEC, a deputada Erika Hilton propõe que essa escala seja eliminada e que a carga semanal máxima de trabalho seja reduzida para 36 horas.
Outro ponto que a PEC aborda é a possibilidade de uma semana de trabalho de quatro dias, o que já vem sendo testado em outros países e promete maior produtividade e qualidade de vida. Esse modelo, sem redução de estratégias, é uma das tendências globais mais discutidas quando o assunto é futuro do trabalho e vem sendo planejado como uma solução viável para promover o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional.
O Apoio Popular e a Mobilização dos Trabalhadores
O PEC ganhou visibilidade e apoio popular, especialmente após o Movimento Vida Além do Trabalho (VAT), liderado pelo influenciador Rick Azevedo, se engajar fortemente em prol dessa causa. O movimento, que começou como uma voz nas redes sociais contra os efeitos negativos da escala 6×1, rapidamente ganhou atração e deu origem a uma petição pública que já ultrapassa 1,3 milhão de assinaturas. Esse apoio popular é um reflexo da necessidade de rever as condições de trabalho e criar alternativas que garantam bem-estar e direitos para os trabalhadores.
Contudo, apesar do apoio expressivo à sociedade civil, a PEC precisa conseguir 171 assinaturas de parlamentares para seguir sua tramitação no Congresso. Até o momento, conta com 134 assinaturas, mas é visível o esforço e o apoio crescente de diversos deputados. A bancada do PCdoB, por exemplo, manifestou publicamente seu suporte à proposta, representando um avanço importante no diálogo sobre o tema no Congresso Nacional.
O Debate Econômico: Quem pagará essa conta?
Embora os benefícios para o trabalhador sejam evidentes, é necessário considerar o impacto econômico de uma mudança dessa magnitude. Para as empresas, especialmente as pequenas e médias, adaptar suas operações para uma jornada reduzida pode representar desafios complexos. Entre eles, estão o aumento dos custos com folha de pagamento e a necessidade de contratação de mão de obra adicional para suprir a redução de horas atuais dos funcionários. Isso, naturalmente, levanta dúvidas sobre quem arcará com os custos dessas mudanças.
Por outro lado, a experiência em outros países que implementaram uma semana de quatro dias aponta para um aumento de produtividade e satisfação entre os trabalhadores, o que pode trazer benefícios para as empresas no longo prazo. No entanto, é importante destacar que a economia brasileira tem suas especificidades, e há temores de que uma medida como essa possa levar a um aumento dos custos empresariais e, consequentemente, gerar pressão inflacionária.
As Categorias Excluídas: Trabalhadores de Aplicativos e Profissionais PJ
Um ponto que considero essencial e que ainda tem sido pouco considerado nas propostas de tramitação é a inclusão de novas categorias de trabalhadores, especialmente aqueles que atuam em modelos de trabalho autônomo, como motoristas de aplicativos e entregadores, além dos profissionais PJ (Pessoa Jurídica) . Essas categorias, que hoje representam uma parcela significativa da força de trabalho brasileira, também enfrentam longas jornadas e condições laborais incertas, mas estão fora do escopo direto do PEC.
Esses trabalhadores, que muitas vezes operam com um nível de insegurança financeira e trabalhista, precisam ser incluídos nas discussões sobre mudanças na jornada de trabalho, pois representam uma nova realidade do mercado de trabalho. Muitos deles são regidos por contratos de prestação de serviços, e não pela CLT, o que dificulta o acesso aos direitos trabalhistas tradicionais. Assim, qualquer mudança nas regras trabalhistas deve, idealmente, considerar essas categorias para que não se tornem desamparadas em um cenário de modernização das normas.
O Caminho Adiante: Um Debate Equilibrado e Profundo
A PEC da escala 6×1 levanta questões essenciais para o futuro do trabalho no Brasil, mas não pode avançar sem um debate profundo e equilibrado. Precisamos considerar tanto os benefícios evidentes para a qualidade de vida dos trabalhadores quanto os desafios e os impactos econômicos para os trabalhadores. É fundamental que esta discussão inclua vozes de diferentes setores — trabalhadores, empresas, economistas e a sociedade civil — para que qualquer mudança na jornada de trabalho seja um avanço significativo para todos os envolvidos.
Como cientista político, acredito que esse é o momento para que o Congresso se posicione de maneira consciente, ouvindo a sociedade, os especialistas e os setores produtivos. A PEC da escala 6×1 representa uma oportunidade para que o Brasil adote práticas laborais mais equilibradas e modernas, mas é essencial que essa modernização seja feita com responsabilidade e transparência.
Acompanhar a tramitação da PEC é essencial para todos nós, pois é através desse engajamento que podemos garantir que a legislação atenda às reais necessidades da sociedade. Vamos observar, debater e, principalmente, participar ativamente dessa construção.